O sono é profundo. "Foram 22 dias dormindo direto. Minha mãe tentava me acordar e não conseguia", conta o soldador Átilla Corrêa. "A primeira vez foram duas semanas", diz o promotor de vendas Elizeu Domingues.
O humor muda. "Eu fico um pouco mais irritado, acho que um pouco mais agressivo também”, Átilla.
Átilla, Bianca e Elizeu convivem com os mesmos sintomas, as mesmas dúvidas e o mesmo preconceito. “As pessoas acham que você é vagabundo, que não quer trabalhar. Comprovar sem saber realmente a doença que tem é complicado. Eu perdi vários empregos”, diz Átilla.
“Falaram que outra pessoa estava em mim, porque o olhar mudava”, conta a estudante Bianca Marcadenti.
“Falaram que alguém tinha feito alguma coisa ou que tinham colocado alguma coisa na bebida”, revela Átilla.
No domingo passado (24), esses três brasileiros perceberam que têm os mesmos sintomas dainglesa Louisa Ball, mostrada no Fantástico. A adolescente chamada pelos jornais britânicos de a verdadeira bela adormecida passa até 22 horas por dia dormindo. Durante o sono prolongado, ela emagrece até cinco quilos. Louisa tem uma doença rara: Síndrome de Klein-Levin, ou SKL.
"Eu me enxerguei nela, porque as mesmas coisas que acontecem com a menina aconteciam comigo”, relata Bianca, de 19 anos, moradora de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. A estudante teve a primeira crise de sono depois de uma internação pra tratar de um problema nos rins.
Em Piracicaba, interior paulista, Átilla Corrêa, de 34 anos, sentiu os primeiros sintomas aos 14. Dormiu por 22 dias. "São dias em que você não aproveita nada. Você simplesmente dorme, se afasta do mundo", conta.
Depois de 20 anos de episódios frequentes de sono, Átilla comemora um ano sem crise. Elizeu, que mora em Matelândia, no interior do Paraná não tem a mesma sorte. O promotor de vendas de 21 anos dormiu uma semana inteira no último mês de abril. “Perdi bastante coisa da minha vida, a convivência com os amigos foi diminuindo, perdi a rotina", conta Elizeu.
Para tentar descobrir o que tem, Elizeu procurou primeiro um médico da rede pública de saúde em Matelândia, no Paraná. Depois, ele se consultou outros profissionais de cidades vizinhas. Os diagnósticos variaram desde distúrbio mental até depressão. Ele já tomou vários tipos de medicamentos, mas até agora nada acabou com as crises de sono.
Elizeu quer saber se o que ele tem é a Síndrome de Klein-Levin. Para isso, viajou para São Paulo, ao Instituto do Sono.
Sensores foram colocados pelo corpo e em 20 minutos Elizeu dormiu. A noite de sono dele foi monitorada por uma equipe de médicos e de técnicos que analisou o tempo todo os sinais emitidos pelos aparelhos que estão com ele. Assim, foi possível saber, entre outras coisas, como está a respiração, os batimentos cardíacos e a atividade cerebral de Elizeu. Esse é o exame mais importante para que se possa começar a traçar um diagnóstico. Uma câmera registrou todos os movimentos. Na manhã seguinte Elizeu passou por uma consulta médica.
Elizeu conta que as crises de sono começaram quando ele tinha 16 anos. “A Síndrome de Klein-Levin costuma se iniciar na adolescência, principalmente em meninos”, diz a neurologista Dalva Poyares. Para a especialista, os resultados não deixam duvida. "É como se a parte mais antiga do cérebro, mais primitiva, estivesse funcionando. Então, somente as necessidades básicas funcionam. Quando não está realizando suas necessidades básicas, ele está dormindo. Não tem outra síndrome que dê isso".
A ciência ainda não conhece a causa da doença e nem sabe por que ela desaparece tão misteriosamente quanto surge. Mas Elizeu voltou para casa com uma resposta. "Agora dá para explicar o que é. Não tem cura, mas pode acabar. Vou tentar seguir uma vida normal”, comemora Elizeu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
esterfeliz12@yahoo.com.br