A variante Fáscio-escápulo-umeral, objeto de estudo do presente trabalho, traz consigo dúvidas quanto à administração terapêutica a ser imposta a um portador da mesma, pois, apesar de haver o conhecimento do gene causador da afecção, o produto deste gene persiste em ser uma incógnita à medicina, bem como a patogenia da d oença. Portanto, faz-se necessário deter a maior gama de informações possíveis acerca da mesma, para que possa ser proposto um tratamento que empreenda a qualidade de vida do paciente..
Sendo assim, e para ilustrar a premissa anterior, conhecimentos de caráter fisiológico, genético, bem como as manifestações clínicas e tratamento médico, fundamentam a base teórica para o profissional de Fisioterapia atingir o grau de segurança necessário para por em prática, técnicas adequadas e eficazes.
Prova-se então, a importância do acadêmico em pesquisar e relatar o assunto, para que os conhecimentos se consolidem, possibilitando uma formação mais séria e completa do profissional, que estará apto a propor um atendimento amplo, detalhado e digno ao paciente, objetivo particular deste trabalho.
DISTROFIA FÁSCIO-ESCÁPULO-UMERAL
A Distrofia Fáscio-escápulo-umeral constitui uma subclassificação das Distrofias Musculares Progressivas, e esta por sua vez, uma variação das Miopatias. Consoante esta afirmação convém esclarecer, primeiramente, algumas generalidades sobre as Distrofias Musculares
Progressivas para, então, enfocar o estudo à variante Fáscio-escápulo-umeral.
Segundo MUMENTHALER(1977), as miopatias são afecções, nas quais o músculo é a sede imediata do processo patológico, sendo o comprometimento do músculo um traço essencial da enfermidade na Distrofia muscular progressiva(DMP). Especificamente, a última, é considerada como a miopatia hereditária de conhecimento mais antigo, sendo também a mais freqüente.
Este autor relata ainda que a patogenia das DMP's decorre de um erro genético da estrutura ou do metabolismo das fibras musculares, cuja natureza ainda não se encontra bem esclarecida. Esta se manifesta lentamente, instalando um déficit funcional de músculos específicos, acompanhados de alterações na estrutura morfológica dos mesmos.
Assim como MUMENTHALER(1977); COHEN(2001), ROWLAND(1997), STOKES(2000) e LIANZA(1995), classificam a variante estudada de forma semelhante, porém LIANZA(1995) acrescenta as seguintes informações: a DMP corresponde a um grupo de doenças geneticamente determinadas a causar fraqueza progressiva com degeneração e atrofia dos músculos esqueléticos. Afirma também, que o estudo histológico destes mostra degeneração de fibras musculares individuais, internalização de núcleos, variação no diâmetro de fibras e infiltração por tecido conjuntivo.
"A classificação da DMP tem obedecido a critérios tais como: de herança, grupo muscular inicialmente envolvido, curso e gravidade da fraqueza muscular, e, ainda, idade do paciente, ao início das manifestações. A maioria das doenças é nomeada de acordo com envolvimento muscular, embora algumas o sejam por epônimos"(LIANZA, 1995).
Já ROWLAND(1997), caracteriza a DMP com 5 características:
1. Miopatia definida segundo critérios clínicos e histológicos, sem sinais de desenervação motora ou sensorial;
2. Todos os sintomas são efeitos da fraqueza dos músculos dos membros ou inervados por pares cranianos, podendo estar comprometidos o coração e os músculos viscerais;
3. Os sintomas agravam progressivamente;
4. Dentre as alterações histológicas incluem a degeneração e regeneração do músculo;
5. A afecção é reconhecida como herdável, mesmo quando não existem passados familiares.
O autor relata ainda não ter conhecimento do porquê da fraqueza muscular mesmo quando se conhece o produto do gene afetado, e por isso, não há a determinação de um tratamento eficaz, sendo apenas trabalhado o caráter preventivo. Salienta, porém, que para denominar corretamente a doença, deve-se ter em mente a diferença de miotonia e distrofia, uma vez que a primeira se dá por uma paralisia muscular sem fraqueza, enquanto que na distrofia muscular miotônica há fraqueza dos membros.
1. DEFINIÇÃO
Define-se Distrofia Muscular Fáscio-escápulo-umeral(FSH) como uma doença hereditária de modo autossômico dominante, podendo manifestar-se em ambos os sexos, com idade de início, gravidade e o curso de ampla variedade. A denominação reflete numa distribuição característica da fraqueza, com uma grande probabilidade de afetar discretamente a face do portador, progredindo paulatinamente para a porção escápulo-umeral do portador, comumente conhecida por cintura escapular.
2. EPIDEMIOLOGIA
* A variante Fáscio-escápulo-umeral é uma das formas mais benignas das Distrofias Musculares Progressivas;
* Segundo MUMENTHALER(1977), na Alemanha existiam cerca de 4/ 1 milhão casos/nascidos vivos;
* Segundo STOKES(2000), no Reino Unido a prevalência é de 1,5-3/100.000 (Emery,1991); e a estimada é de 1,5-2/100.000 na Europa e América do Norte, com ambos os sexos afetados igualmente;
* Dados atualizados do National Institute of Neurological Disorders and Strokes (Instituto Nacional de Distúrbios e Traumas Neurológicos) nos Estados Unidos, publicados na Revista Neurology, datada de 08 de agosto de 2002, indicam que a Distrofia Fáscio-escápulo-umeral é a terceiro distúrbio neuromuscular hereditário mais comum, perdendo apenas para a variante de Duchene e a Distrofia Miotônica;
* Ainda segundo o National Institute of Neurological Disorders and Stroke esta variante afeta
3. GENÉTICA MOLECULAR
Distúrbio hereditário autossômico dominante, localizado no cromossomo 4q35-qter, porém sem mapeamento do produto do gene; salientando que o mecanismo de herança é idêntico à Distrofia Miotônica, com risco de 50% de transmissão genética para seus descendentes.
Recente estudo divulgado na Revista Neurology, realizado pelo National Insitute of Health/ National Insitute of Neurological Disorders and Strokes, em 09 de agosto de 2002, demonstra que a repetição anormal de seqüências de DNA no braço curto do cromossomo 4 interfere na função de uma complexa proteína que controla os genes proximais. Isto resulta numa hiper-atividade de vários genes que exercem influência sobre o distúrbio.
Em 1992, portadores da variante Fáscio-escápulo-umeral tipicamente tinham menos de 11 cópias desta seqüência de ácidos nucléicos, denominado
A pesquisa também analisou a interação entre a seqüência D4Z4 a as proteínas presentes nos núcleos das células, revelando que uma parte da seqüência une-se a complexos protéicos que normalmente suprimem a atividade do gene. Menos de 11 cópias de D4Z4 reduz o número de complexo protéico funcional, que, em contrapartida, reduz o controle dos genes das porções proximais do cromossomo.
As conclusões desta não forneceram dados suficientes para afirmar se a hiperatividade do genes do cromossomo 4 é responsável pelos sintomas da Distrofia Fáscio-escápulo-umeral. Contudo, um dos genes considerados, denominado ANT1, provocam a morte de células-gatilho quando estão demasiadamente ativas. Contudo isto pode ser a causa pela perda progressiva de células musculares neste distúrbio, traduzindo-se
4. PATOGENIA
Pode ser produzida miotonia ou rigidez através das alterações de genes dos canais iônicos do Cloro, Cálcio ou Sódio. A maioria dos portadores desta variante possuem deleções D4Z4 e mutações que afetam o complexo protéico, com apenas 5-10% não possuindo estas deleções. Pesquisas identificaram pessoas não portadoras da doença, porém com a região D4Z4 e muitos outros genes próximos ausentes; sugerindo que uma região D4Z4 anormal provoca, de alguma forma, degeneração das células musculares e/ou, que os genes próximos a esta região são necessários para o desenvolvimento da doença. Esta ainda refere que seqüências repetitivas de DNA possuem um início insidioso a influenciar a atividade genética.
5. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
* Atrofia de grande parte da face, com evidenciada fraqueza nos movimentos labiais conduzindo a inabilidade de franzí-los, até a um sorriso transversal, de eversão labial e alargamento da fenda palpebral. Um achado característico inclui não possuir a capacidade de assobiar ou encher um balão;
* Atrofia assimétrica do cíngulo do membro superior e dos músculos proximais do braço; a escápula alada ou "formação de plataforma" no ombro na abdução dos membros superiores reflete atrofia dos músculos serrátil anterior, do trapézio e do rombóide. Posteriormente, os músculos bíceps e tríceps braquial são afetados. Os músculos deltóides são preservados em 50% dos casos, mas mesmo se não ficarem comprometidos, perdem sua vantagem mecânica, devido à falta de estabilidade do cíngulo do membro superior, causando limitação da abdução e flexão ativas. O paciente pode compensar muito bem, com movimentos artificiosos para levantar a mão acima do ombro, mas o comprometimento pode se tornar óbvio com a exigência da movimentação resistida;
* A cintura escapular apresenta, na vista anterior, as clavículas e as extremidades das escápulas projetam-se acima da fossa supraclavicular, a atrofia dos peitorais afeta a prega axilar anterior que assume uma posição vertical ao contrário da diagonal normal;
* O pé torto pode ocorrer no início da doença, devido à fraqueza dos músculos fibular e tibial anterior. A atrofia dos músculos dos membros inferiores pode progredir para a perda da deambulação.
DISTÚRBIOS ASSOCIADOS
ROWLAND(1997), afirma que na forma infantil da patologia pode ocorrer surdez, sintomas orofaríngeo, retardo mental e diplegia facial.
6. DIAGNÓSTICO
A confirmação deste ocorre por meio da Eletromiografia-EMG, biópsia muscular e o nível de CK no soro a se apresentar normal ou elevada, nas formas adultas da distrofia. Com freqüência a EMG e Biópsia muscular revelam um padrão miopático. O ECG-Eletrocardiograma é normal ou com alterações comuns da idade demonstrando aterosclerose.
6.1- Diagnóstico Diferencial
Deve-se diferir a Distrofia Fáscio-escápulo-umeral, clinicamente, dos outros tipos de DMP através do seguinte:
ASPECTOS | DUCHENE | FSH | MIOTÔNICA |
Idade de Início | Infância | Adolescência, rara na infância | Adolescente, congênita(rara) |
Sexo | Masculino | Ambos | Ambos |
Pseudo-hipertrofia | Comum | Nunca | Nunca |
Início | Cintura Pélvica | Cintura escapular | Membros distais |
Fraqueza Facial | Rara e Leve | Sempre | Comum |
Velocidade de Progressão | Relativa rapidez | Lenta | Lenta(variável) |
Contraturas e Deformidades | Comum | Rara | Rara |
Cardiopatia | Tardia | Nenhuma | Comum(condução) |
Herança | Recessiva, ligada X | Dominante | Dominante |
Expressividade | Plena | Variável | Variável |
Heterogeneidade Genética | Alélica, esta/Becker | Nenhuma | Fraqueza proximal dos membros |
De caráter sintomático.
7.1 - Tratamento Cirúrgico
A fusão tóracoescapular pode ser efetiva para os pacientes com escápula alada, desde que se preserve o músculo deltóide funcional. Uma certa melhora da amplitude de movimento(AM) de ambos os ombros pode ser obtida, o que é muito benéfico para os pacientes cuja profissão requer capacidade de manter flexão e abdução. Utiliza-se, freqüentemente, órteses tornozelo-pé para o pé torto.
7.2 - Tratamento Medicamentoso
Com os resultados da pesquisa anteriormente relatada, os pesquisadores terão subsídios suficientes para descobrir como as deleções da região D4Z4 afetam os genes, proporcionando estratégias para combater e tratar a doença. Estes poderão ser capazes de encontrar uma maneira de imitar o efeito do complexo protéico suprimido que produz o mau resultado neste distúrbio, reduzindo assim a atividade de todos os genes afetados. Se o gene específico que causa a distrofia for identificado, os pesquisadores também terão meios de diminuir ou interromper a atividade do gene com drogas ou outros tratamentos.
8. COMPLICAÇÕES
Decorrem da complicada intervenção cirúrgica de fusão tóracoescapular, podendo originar complicações respiratórias como pneumotórax, efusão pleural, atalectasia; e ortopédicas - fratura da escápula e pseudo-artrose.
9. CONDUTA FISIOTERAPÊUTICA
9.1 - Considerações iniciais:
O tratamento está sujeito a apresentação dos sinais e sintomas, bem como do prognóstico para, então, serem definidas as metas e conduta traçada.
O tratamento pós-operatório depois da fixação escapular requer que o ombro seja imobilizado com material gessado com o braço em abdução, na posição de continência durante 2-3 meses. Os exercícios isométricos do músculo deltóide devem ser incentivados com o gesso colocado.
A provável ocorrência de atrofia muscular por desuso durante o período de imobilização, implica que os pacientes com atrofia leve a moderada, em vez de grave, têm maior probabilidade de se beneficiarem com a intervenção cirúrgica. Todas as partes precisam ter clareza sobre o que o paciente será capaz de enfrentar em termos práticos e psicológicos.
É importante não desprezar o comprometimento do tronco e dos membros inferiores, pois a atrofia do extensor do quadril pode originar lordose compensatória e dor localizada.
Concentra-se, então, nos exercícios cinesioterápicos de fortalecimento deste músculo e do tronco. O apoio flexível da coluna vertebral pode aliviar os sintomas das costas sem destruir a lordose funcional necessária, embora seja difícil haver conciliação das duas coisas. O fisioterapeuta deve atentar também, para o desenvolvimento de contraturas dos flexores do quadril, que podem agravar o problema supracitado, ou seja, necessita-se trabalhar continuamente os membros inferiores como um todo não só no âmbito manutensivo, mas sim, no preventivo.
9.2 - Metas:
- Orientar as ABVD´s (atividades básicas da vida diária) por meio de posicionamentos e adaptações domiciliares ao paciente;
- Prevenir deformidades e contraturas;
- Prevenir complicações respiratórias;
- Manter a funcionalidade através da ADM (Amplitude de movimento) em membros e face;
- Manter/empreender o tônus, trofismo, flexibilidade e força;
- Estimular a fala;
- Treinar a marcha.
9.3 - Recursos Fisioterapêuticos:
- CINESIOTERAPIA: mobilização global (MMSS e MMII), exercícios passivos, ativo-assistidos e ativos livres, alongamentos;
- EXERCÍCIOS FACIAIS: mímicas, caretas, exercícios auto-passivo;
- EXERCÍCIOS RESPIRATÓRIOS: técnicas de expansão torácica, inaloterapia, drenagem postural acompanhada de manobras de vibro-percussão, indução da tosse e os exercícios respiratórios propriamente ditos;
- HIDROTERAPIA: para alívio da dor durante o alongamento muscular, relaxamento muscular, manutenção ou aumento do grau de movimentação das articulações, reeducação de músculos comprometidos, fortalecimento de músculos enfraquecidos, aquisição e vivências de diversas posturas, treino de marcha, melhora das condições respiratórias por meio de técnicas aquáticas como Bad Ragaz, Watsu, Halliwick;
- ÓRTESES: uso adequado de tutores curtos ou longos (onde o prognóstico requer tal procedimento) a fim de manter a extensão dos joelhos, dorsoflexão dos tornozelos e estabilidade pélvica, prolongando assim o tempo de deambulação independente e a manutenção da postura ortostática.
CONCLUSÃO
Conjuntamente com a pesquisa em referência, de revisão bibliográfica e compilação de dados para a realização deste trabalho, desenvolveu-se um estudo associando o caso clínico da paciente da clínica-escola de Fisioterapia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB - Campina Grande, PB), D.L.S., 2 anos - à observação ativa do tratamento imposto à mesma.
Após conhecimento teórico das indicações terapêuticas da afecção, averigua-se a importância de lançar mão de mais um setor da fisioterapia, não só o neurológico, mas também o de traumortopedia e respiratória, tendo em vista a gravidade que esta doença pode adquirir.
Vivenciando as técnicas impostas, foi passível de constatação o potencial fisioterapêutico em aliar as técnicas dos três setores, identificando as vantagens de aplicabilidade destes, uma vez que há uma conjunção de benefícios em se preocupando com a capacidade funcional do corpo como um todo, e prevenindo complicações ou a evolução da distrofia em velocidade elevada.
Com isto deu-se início ao programa, sendo organizado, considerando componentes específicos como: sinais e sintomas presentes, avaliação da condição corpóreo-motora a envolver força muscular, alongamento, resistência e relaxamento.
Este tipo de atuação em si, recente na clínica-escola da universidade em questão, vem demonstrando que cada setor detém características intrínsecas as quais devem ser exploradas em uma fusão de técnicas, não numa fissão constante. Assumir esta postura diante da prática fisioterapêutica apenas confirmou o que teoricamente já se idealizava e, é desta maneira, que a profissão é empreendida através dos anos, sendo utilizada para a melhoria tão fundamental do tratamento e proservação das diversas afecções existentes.
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